domingo, 29 de novembro de 2009

Novas formas de leitura e escrita ainda não estão presentes na escola

Pesquisador aposta na renovação do currículo escolar para a adaptação do ensino à nova realidade  


O acesso às novas tecnologias levou a sociedade a uma nova realidade. Surgiram novas formas de leitura e escrita. Hoje o texto não é mais centrado no verbo, na palavra, ele interage com imagens, áudio e vídeos. E a escola caminha ainda desalinhada a essa nova realidade. Enquanto os alunos vivem em uma sociedade visual ou audiovisual, a escola ainda está centrada na palavra. Essa é a constatação do professor Luiz Fernando Gomes, doutor em Linguística Aplicada, professor de Linguística e Semiótica, e coordenador do Centro de Educação e Tecnologia da Universidade de Sorocaba (Uniso).

Gomes pesquisa a possibilidade de a escola inserir essas novas linguagens no currículo escolar, para que a criança aprenda a olhar, analisar, criar e desenvolver essas habilidades. “Porque se a tendência for essa que temos observado, em que cada vez mais o audiovisual ocupa o espaço da palavra escrita, é preciso aprender a compor um texto audiovisual”, enfatiza o professor.

A nossa cultura sempre foi do ensino e da leitura dos textos verbais, e não havia preocupação em ensinar essa combinação multimodal (diversas formas de texto) para os professores, que, dessa forma também não repassavam isso para os alunos. “Nossa hipótese é que as pessoas fazem essa ligação entre as modalidades de texto mais por intuição do que por conhecimento”, diz Gomes.

Até mesmo ao utilizarmos softwares que permitem montar apresentações com inserção de texto e imagem, nem sempre sabemos fazer a interação de forma coerente, argumenta o pesquisador. Para ele, aprendemos a mexer com o software e, por tabela, com as linguagens, mas nem sempre tudo o que fazemos em relação à linguagem é bem feito. Na produção de vídeos, a dificuldade é ainda maior. “Fazer um filme com quadros, movimentando e inserindo, é mais difícil do que compor uma imagem”, esclarece.

Gomes adverte também que nos bancos de imagens de alguns programas há imagens que correspondem a uma cultura hegemônica e representam um tipo social e se a pessoa não sabe ler uma imagem, acaba interpretando ela como uma descrição fiel da realidade. Quando utilizamos imagens em sites de busca ou bancos de dados na internet, estamos nos apropriando do discurso de outras pessoas, pensando que é nosso. “Se o usuário não analisar aquela imagem, provavelmente, vai fazer uma leitura incompleta ou cheia de falhas, e no final da composição, o resultado também sairá com falhas”, alerta.

Para o pesquisador, o que falta é sistematizar os modos de ensinar a estrutura da linguagem audiovisual e depois propor isso dentro de um currículo, preparando a escola e os professores para a execução dessa nova possibilidade. “Às vezes, se ensina muito sobre as ferramentas que dominamos, ao invés de ensinar para o futuro das crianças, usuários da linguagem”, comenta.

A proposta da pesquisa foi aplicada através de um projeto de extensão da UNISO em parceria com a ONG Pérola e patrocínio do Banco Santander. O projeto “Vozes que Ecoam” iniciou em 2008 nas unidades Sabe Tudo de Sorocaba (quiosques com computadores que ficam nos bairros periféricos da cidade). Foi ensinado aos alunos a multimodalidade, e no término do curso, eles produziram vídeos. Gomes conta que apesar de alguns alunos não dominarem a linguagem do audiovisual, o que é natural, muitos grupos conseguiram produzir textos extremamente bem feitos em relação à linguagem e à exploração dos recursos.

Foram ensinados também professores da rede pública municipal para que eles usem a proposta nas escolas. “Os resultados ainda não são muito bons, pois não é algo fácil, depende de uma série de fatores, preparação dos professores, da escola. Mas o resultado que tivemos dá a idéia de que é possível trabalhar com isso e que os alunos se sentem muito motivados, por ser a linguagem deles”, relata o professor.

O pesquisador também insere sua visão no Mestrado em Educação da Uniso, onde trabalha em uma linha de pesquisa que lida com o cotidiano educacional e a inserção da tecnologia. O foco é a mudança que ocorre quando você solicita uma pesquisa ao aluno e ao invés dele consultar uma enciclopédia virtual ou sites de busca, procura sites com vídeos. E o professor, ao invés de apresentar o vídeo na sala de aula, leva a enciclopédia tradicional. “Muda para o professor, muda para a prática de estudo do aluno, muda para a própria construção da sala de aula, e assim por diante”, conclui Gomes.

(Reportagem produzida pela aluna de Jornalismo Tatiana Plens para a Unipress – Agência de Notícias da Universidade de Sorocaba.)

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